Flor de Lótus


Sei pouco sobre flores e desta, que todos conhecem, ainda menos.
Sou assim em tudo.

Escolho as músicas e as palavras guardadas nas capas de papel dos discos de vinil.
Escolho as marcas de cigarros que já ninguém fuma.
No armário, de madeira clara, feito de folha de mangueira, guardo as histórias,
Os livros, os discos e até as cassetes,
como as estátuas de David, expostas em museus,
no meu quarto,
com séculos de vida.

O quarto, onde escondo os grãos de areia trazidos da rua,
Das despedidas e dos abraços do amanhã,
Entre as músicas de inverno, que gosto de tocar no verão,
Livre, sem regras, do Pop ao Indie,
Em silêncios, ou em conversas intermináveis,
Onde me vou perdendo e onde me conheces.

Passados estes anos ainda escolho o dourado para selar as cartas,
Cheias de palavras trocadas, que te deixo escritas em cadernos de papel.
São incompreensíveis como a minha letra,
Que se desenha sem freio, livre, errante, como sempre.

Não sou uma flor de lótus.
Talvez pudesse ser um cato.
Um cato bravo, para pores à janela da sala.


(Porto, 21 de Maio de 2020)

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