Vou escrever-te uma carta. Apaguei os versos uma, duas, três, quatro vezes e as palavras não encaixam em lugar nenhum.
Parece que construí estas regras invisíveis. Mas o tempo trouxe-nos até aqui. E aqui te olho e aqui te sorrio. E aqui te desejo.
(A centímetros. Começámos.)
Dás-me as mãos e o tempo para, como se o tivéssemos enganado e roubado para o ter só agora. E há muito que não me sentia vivo, assim, dentro de mim, a empurrar, a bater contra o meu peito, a querer sair.
(Ouves? Sou eu a chegar até ti.)
E estávamos ali os dois, a preencher o tempo com as nossas palavras, os nossos jogos, a adiar um abraço, um beijo, um toque, que nos desperta e faz saltar. Vertigens.
(Ninguém viu.)
Inspiro. Respiro. Uma, duas, três, quatro vezes e as palavras não encaixam em lugar nenhum. Como se já não me lembrasse de ter passado por aqui. E, de novo, o tempo.
Aqui estou. Sinto-te. Preso nas minhas mãos. O corpo, vivo, acabado de nascer.
Inspiro. Respiro. De novo o tempo. Em direcção ao chão. Suspensos. Puxas-me, ou seguras-me.
(Já todos os outros falam.)
Inspiro. Respiro.
Abro os olhos e os teus tão bonitos, serenos. Ali. Pouso os pés no chão.
(A centímetros.)
Escrevo-te esta carta porque talvez não tenhas viajado comigo até aqui, ou talvez seja deste cansaço. Talvez seja deste último copo de vinho, ou então é da pouca luz deste quarto, que te leva para o início desta história. Esta noite sei que fui e voltei.
Com os mesmos medos e a falta de jeito de adolescente. Com a mesma necessidade de estar perto.
(Dizes que somos bonitos. E talvez não devêssemos ter vindo até aqui. E sorris. Adormeces. Apago a luz.)
(9/2/2025)
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